top of page
salazar deus patria e familia.jpg

Cartaz de propaganda do Estado Novo. Salazar como Salvador da Pátria. Uma referência a D. Afonso Henriques,

a lição de salazae.jpg

Cartaz de propaganda do Estado Novo. "A lição de Salazar" com a trilogia da Educação nacional

Marcelo Caetano conversas em familia.jpg

"Conversa em Família" de Marcello Caetano na RTP. Reflexões e explicações aos portugueses das políticas do Estado Novo.

O Estado Novo

 

A 28 de maio de 1926, o movimento militar, iniciado em Braga pelo General Gomes da Costa, derrubou o regime democrático instalado em 1910. Dessa época datam a censura à imprensa e outras medidas repressivas. Face ao fracasso da política financeira, Salazar é convidado a ingressar no Governo e após conseguir resolver os problemas financeiros (com medidas de controlo apertado), o que lhe conferiu um grande prestígio e que o aclamou como “Salvador da Nação”, em 1932, é nomeado Presidente do Conselho e em 1933 foi aprovada uma nova Constituição que deu início ao Estado Novo.

O regime do Estado Novo, com as suas características autoritárias e nacionalistas, encontraram na época boa aceitação no contexto internacional, pois nos últimos anos tinha-se verificado uma implantação de regimes ditatoriais em muitos países europeus.

Algumas medidas decretadas por Salazar, mostram a nova orientação do regime, como por exemplo, em 1929, a autorização do regresso das ordens religiosas que tinham sido expulsas e a publicação do Ato Colonial que evidenciou o seu caráter nacionalista.

Consolidação do regime salazarista:

No ambiente caracterizado pela crise mundial em 1929 e pela ascendência do fascismo europeu, o regime português consolida a base autoritária e corporativa. Esta nova ideologia criará sucessivamente:

  • O “Estado Novo” e a “União Nacional”;

  • A Constituição de 1933;

  • O Estatuto do Trabalho Nacional e a Organização Corporativa e o Secretariado da Propaganda Nacional.

 

Em 1936, surgem as organizações repressivas e os mecanismos de controlo da população. De forma a enquadrar as massas tínhamos a Mocidade Portuguesa e a Legião Portuguesa. O aparelho repressivo assentava na censura prévia e na polícia política (PVDE, mais tarde PIDE). O Estado Novo conseguiu, assim, impor-se graças ao controlo apertado que a censura exercia sobre os cidadãos e à negação dos direitos e garantias individuais.

Houveram momentos de resistência, tanto à ditadura militar como ao período inicial do Estado Novo:

  • 3-9 de fevereiro de 1927 – movimento militar no Porto e em Lisboa contra a ditadura;

  • 20 de julho de 1928 – movimento militar contra a ditadura;

  • Abril/Maio de 1931 – Revolta militar na Madeira;

  • 26 de agosto de 1931 – Revolta militar em Lisboa;

  • 18 de janeiro de 1934 – Revolta da Marinha Grande;

  • 10 de setembro de 1935 – Revolta da Penha de França;

  • 9 de setembro de 1936 – Revolta dos Barcos no Tejo;

 

Estas sublevações serão todas derrotadas com um saldo de centenas de mortos, feridos, deportados e exilados. As Forças Armadas tornam-se um instrumento na consolidação do poder.

Portugal e a Guerra Civil de Espanha

 

Salazar, durante a Guerra Civil de Espanha, concedeu facilidades e apoio às forças políticas de direita que conspiravam contra os republicanos no poder. Este apoio serviu para evitar que as forças de oposição ao regime do Estado Novo ganhassem novo alento, pois a vitória da Frente Popular nas eleições de 1936, em Espanha, constituía uma ameaça à manutenção do Estado Novo. Em Portugal, a Guerra Civil de Espanha e a vitória das forças franquistas contribuiu para um reforço do autoritarismo do regime. Para selar este apoio, a 17 de março de 1939, Salazar e Franco assinam o Pacto Ibérico, um tratado de amizade e não-agressão.

Ao eclodir a Segunda Guerra Mundial, em 1939, Portugal declarou-se neutral. Neste aspeto, foi importante a manutenção da neutralidade por parte de Espanha, e o facto de a Alemanha não ter chegado a invadir a Península Ibérica, como esteve para acontecer. A manutenção da neutralidade de Portugal constituiu um grande trunfo para Salazar, granjeando-lhe enorme popularidade no país.

A Oposição ao Estado Novo

Até 1945, somente a União Nacional poderia concorrer às eleições, mesmo quando a oposição pôde concorrer, as condições da campanha foram desiguais e com irregularidades no processo eleitoral. Nesses momentos de forte oposição ao regime, podemos referir, em 1949, quando a oposição apresenta a candidatura do general Norton de Matos às eleições presidenciais. Esta campanha mobilizou dezenas de milhares de pessoas em comícios e reuniões, mas teve que enfrentar uma forte repressão, o que fez com que Norton de Matos desistisse, pois não havia garantias de liberdade de votar, tendo sido reeleito o general Óscar Carmona. Nas eleições à Presidência da República de 1958, ao candidato do regime, Almirante Américo Tomás, opunha-se o general Humberto Delgado. O período eleitoral decorreu em clima de forte repressão e intimidação. A candidatura do general Humberto Delgado foi apoiada por grandes multidões. Tudo indica que houve fraudes nas eleições, sendo eleito Américo Tomás.

À campanha eleitoral de Humberto Delgado seguiram-se uma série de ações de combate à ditadura, que acentuaram a crise do regime (Revolta da Sé; assalto ao paquete Santa Maria; lançamento de panfletos sobre Lisboa; assalto ao Quartel de Beja; manifestações de estudantes universitários; manifestações no mês de maio de 1962).

A partir dos anos de 1960, Portugal passou a estar cada vez mais isolado em virtude das mudanças do contexto internacional e à manutenção de um império que negava o direito à autodeterminação das suas colónias.

A Guerra Colonial

 

A partir de 1961, os movimentos de resistência que se tinham formado nas colónias portuguesas, desde a década de 1950, iniciaram uma luta armada pela independência dos seus territórios. Portugal insistia num dos princípios de base do Estado Novo que era a integração dos territórios coloniais portugueses como território nacional, defendendo uma nação multirracial e pluricontinental. Passou, assim, a manter uma guerra que durou 13 anos, em várias frentes, com inúmeros contingentes de tropas mobilizadas para os seus territórios. A vida dos portugueses tornou-se mais difícil porque a manutenção de uma guerra absorvia grande parte dos recursos nacionais, para além dos dramas de guerra, que cada vez eram mais notados e contestados.

Vasco Luís Curado, no seu livro Declarações de Guerra, apresenta os dados do Estado-Maior General das Forças Armadas:

  • O número de militares portugueses mortos nas três frentes de combate, na Guerra Colonial de 1961-1974, foi de 8831. Outras fontes falam de 8289;

  • Outras fontes estimam que foram mortos 100 000 civis africanos e mais de 1000 civis colonos. Foram feridos cerca de 100 000 militares portugueses, incluindo 20 000 deficientes permanentes e, destes, 5120, com grau de incapacidade superior a 60 %;

  • Terá sido mobilizado quase um milhão de homens. Outras fontes falam de 800 mil soldados, calculando-se em 10 % os que sofrem de perturbação de stresse pós-traumático. Procuramos em outras fontes o valor exato e ronda os 140 mil com traumas psicológicos para toda a vida;

  • Portugal chegou a gastar mais de 40 % (dependendo das épocas e receitas anuais) do Orçamento do Estado no esforço de guerra;

  • O serviço militar durava dois e meio a quatro anos, com uma comissão de serviço de dois anos numa das colónias.

 

De forma a iniciarmos a nossa reflexão sobre o peso e angústia que a guerra causava nos combatentes e seus familiares, e sabendo que como consequência desta guerra, muito ex-combatentes continuam com sequelas físicas e psicológicas. Começamos por explicar, com o auxílio do livro Declarações de Guerra, qual a origem dos problemas psicológicos quem advém da experiência de guerra. O autor explica que, existiam muitos entusiasmados para a defesa de Ultramar, no entanto, um número considerável desertava, saíam do país para não serem recrutados. O autor, sendo também psicólogo clínico, explica:

(...) os combatentes procuravam outras formas de anestesia emocional (álcool, drogas, jogos),… o problema é o regresso à vida civil, passado o estado de dormência, o militar volta à consciência individual e assume pessoalmente coisas que tinham sido coletivas, levando em cheio com os estilhaços de uma bomba ao retardador: a culpa, os pensamentos intrusivos, os pesadelos, as insónias, a irritabilidade, o alerta constante (...)

Neste livro, pudemos ler testemunhos de soldados, Furriéis, Tenentes de Operações especiais, Primeiro-sargento, Alferes, Primeiro-cabo, marinheiro. São testemunhos impressionantes, que demonstram os horrores vividos na Guerra Colonial. Se pensamos que conseguimos imaginar como será uma guerra, estamos muito enganados! Não há palavras que consigam descrever como nos sentimos quando lemos estes testemunhos. Se assim é, torna-se inconcebível imaginar o impacto psicológico que os atormentou e ainda atormenta. As crueldades da guerra, mantém, atualmente, resquícios desses tempos, refletindo-se no dia-a-dia destes ex-combatente. De facto, a guerra não ensinou a viver com ela. O principal problema psicológico que aflige os ex-combatentes chama-se transtorno de estresse pós-traumático.

Dito tudo isto, não é de admirar que surgissem vozes contestatárias, que as primeiras reuniões tenham surgido, que o Movimento dos Capitães tivesse evoluído para o Movimento das Forças Armadas. Tornava-se urgente solucionar a questão da Guerra Colonial.

Nas palavras de Vasco Lourenço:

(...) O exemplo que eu lhe posso dar para mostrar o sentimento da generalidade dos militares, oficiais, sargentos e praças, era este: A comissão normalmente durava 2 anos, às vezes menos uns dias, outras vezes prolongava-se, infelizmente havia situações em que chegava quase aos 3 anos. Mas cada um tinha uma folha de papel quadriculado, em que punha os meses, os dias, e ia fazendo cruzinhas cada dia que passava, para ver quantos dias faltavam para regressar. Portanto, a situação é esta, eu para os meus soldados que foram comigo fazer a guerra na Guiné, a situação era esta: " vocês têm duas opções: Ou querem viver em Portugal, naquilo que se chamava metrópole na altura, e têm que ir à guerra, porque senão prendem-vos e não vos deixam viver aqui em paz ou opção é a de poder não viver em Portugal, e então têm de ir para o estrangeiro, desertar e não ir à guerra.” E portanto, as grandes generalidades dos soldados iam à guerra claramente porque eram obrigados a ir à guerra.

Não iremos colocar nenhum excerto dos testemunhos, mas como forma de percebermos melhor como se sentiam os soldados, transcrevemos a música “desertor” de Luís Cílio, 1966.

Oh mar… oh mar…

Que beijas a terra,

Vai dizer à minha mãe

Que não vou p`rá guerra.

 

Diz, oh mar, à minha mãe,

Que matar não me apraz

No fundo quem vai à guerra

É aquele que a não faz.

 

Vou cantar a Liberdade,

Para a minha Pátria amada,

E para a Mãe negra e triste

Que vive acorrentada.

 

Mas a voz do nosso povo,

No dia do julgamento,

Te dirá a ti, oh mar.

E dirá de vento a vento,

 

Quem são os traidores,

Se é quem nos rouba o pão

Ou se nós os desertores

Que à guerra dizemos «Não».

 

Este disco não foi editado em Portugal, e este filme é da televisão francesa que entrevistou o Luís Cilia, em 1966, num programa sobre a juventude. Segundo a biografia deste cantor, Luís Cilia, foi o primeiro cantor de intervenção que, no exílio e desertor do exército português, denunciou a guerra colonial e a falta de liberdade em Portugal.

 

Esta canção, para nós, é uma crítica muito direta da Guerra Colonial, ao contrário das elaboradas por outros cantores de intervenção, que pela opressão da censura tiveram que "semear" palavras com simbologias ligadas à Guerra e crítica ao regime do Estado Novo. O cantor exprime a saudade que sente pela sua Pátria e pela sua família. Critica fortemente quem faz a guerra, acusando-os de usarem os soldados e apela à Liberdade da sua Pátria e de África. É uma canção com uma mensagem direta, com uma melodia saudosista e melancólica, aliás, que outra melodia poderia representar os horrores de uma guerra, mas também recheada de esperança: “ Mas a voz do nosso povo/no dia do julgamento/ te dirá a ti, oh mar/e dirá de vento a vento/ quem são os traidores.”

 

 

Marcello Caetano: A evolução na continuidade

 

A partir dos anos de 1960, a sociedade e a economia estavam diferentes, ocorreram profundas alterações a nível de valores em Portugal. Contudo, continuava a impor-se um setor que apostava na continuidade, sendo mais conservador e com fortes apoios políticos e militares. Marcello Caetano, desenvolveu uma política, tentando comprometer-se com as duas correntes da altura, a mais conservadora, como já referimos, e uma mais liberal. Apelidando esta política de "evolução na continuidade".

Marcello Caetano, no sentido de mostrar a sua tolerância e vontade de renovação, tomou algumas medidas que indiciavam uma “Primavera Marcelista”. Abrandou a atuação da PIDE (a partir de então Direção-Geral de Segurança – DGS), moderou o papel da censura; autorizou o regresso de alguns exilados políticos; permitiu a entrada de alguns políticos liberais na União nacional, que, a partir de 1970, passou a chamar-se Ação Nacional Popular; facilitou a entrada de capitais estrangeiros para promover a industrialização do país, o projeto de Sines constituiu o maior empreendimento do Governo de Caetano; alargou a Previdência Social aos trabalhadores rurais; os trabalhadores passaram a receber o 13.º mês; concedeu o abono de família; entre outras medidas.

No entanto, a recusa da democratização ficou evidente com as eleições de 1969. Apesar das promessas, a campanha eleitoral decorreu com bastantes irregularidades, como assaltos às sedes de campanha, apreensão de programas políticos, agressões a candidatos e ameaças de vária ordem. A fraude eleitoral deu a vitória esmagadora ao partido do Governo, com todos os lugares preenchidos por deputados oriundos da Ação Nacional Popular. Os deputados da “ala liberal” que tinham assento na Assembleia Nacional se viam impossibilitados de proceder a reformas liberalizadoras.

Com esta “abertura” em certos aspetos, e sendo mais toleráveis as ideias liberais, seria uma questão de tempo para que as situações pendessem a favor de uma sociedade liberal. Começaram a ser muito evidentes, ou do conhecimento geral, as diferenças entre os mundos democráticos liberais e os regimes autoritários. O mundo estava a mudar. As pressões externas eram claras, a penetração de valores contrários ao autoritarismo eram cada vez mais evidentes. As camadas mais jovens estavam descontentes com o rumo das políticas que se faziam sentir em Portugal. Conclui-se que seria muito difícil querer o melhor dos dois mundos.

A contestação estudantil e social

Durante a década de 1960, os jovens foram adquirindo um papel relevante na sociedade, manifestando-se. Em França, maio de 1968, os estudantes marcaram a diferença com a realização de uma revolta estudantil, começou nas universidades de Paris e, com o apoio dos sindicatos, alastrou-se a toda a França.

Em Portugal, o movimento das associações académicas renasceu em finais de 1968. Antes disso, houve um breve episódio em 1962, episódio esse que levou Marcello Caetano a demitir-se porque não gostou da intromissão do Governo na decisão de proibir as comemorações do dia do estudante. No entanto, pela continuação da repressão do Governo, em 1969 as reivindicações estudantis prolongaram-se, evidenciando o sintoma de mal-estar social que se vivia no país.                                               

Vídeo do youtube, publicado por LeoMOV
Luís Cília, "Canto do desertor", 1966

bottom of page